Preparação
Meu amigo Pastor e eu, com o intuito de ganharmos mais experiência no mundo vertical, procuramos nosso camarada Gustavo Vianna para umas aulinhas de vias de parede.Lá fomos nós para nossa primeira empreitada. O local escolhido foi a pedra menina, próximo a Carandaí-MG. O maciço é bem bonito, de granito gnaisse, localizado numa região rural de gente muito boa e receptiva.
Dentre as várias vias disponíveis, escolhemos a via No Último Minuto 5+ VIsup (7a/A0) E3 D1. Tínhamos o croqui desta via e de várias outras, selecionamos esta pois gostamos da linha e das características técnicas (mal sabia eu o que era o diabo de um E3, mas estava prestes a conhecer).
Nenhum de nós nunca tínhamos ido até o local. Além do croqui, tínhamos informações de como chegar no lugarejo e na pedra, passadas pelo pessoal que costuma frequentar o pico.
As informações não se mostraram muito precisas, a partir daí surgiu minha idéia de montar um relato com informações mais detalhadas.
Como chegar até a Pedra Menina:
Partindo de Belo Horizonte, a ida pode ser
dividia em três partes:
1.
Saída de BH pela br040 sentido Rio de Janeiro.
Ao passar o trevo de Carandaí, 500 metros a frente terá uma sequencia de dois
viadutos bem próximos um ao outro. Deve-se entrar a primeira à esquerda
EXATAMENTE após o segundo viaduto. Há um retorno cerca de 1 km a frente, num
posto de gasolina.
2.
Seguir
direto até o povoado de Palmital dos Carvalhos. A estrada de asfalto irá cair na
avenida principal do vilarejo que tem um CANTEIRO CENTRAL. Vire à direita, siga
em frente, passe a igreja e continue reto. Vire a DIREITA na bifurcação de
estrada de terra a qual esta estrada termina;
3.
A
Partir daí, vire sempre a ESQUERDA. O próximo vilarejo é o do pião, onde a
rocha se encontra. Siga reto até a pequena igrejinha a sua direita. A ingrejinha
fica atrás de uma tronqueira. Ao lado de um Butequim. Daí há varias opções de onde
deixar o carro e começar a caminhada. Ou na igreja mesmo, ou seguir reto mais
uns 500 metros de carro na estrada e entrar nas fazendas á direita. Olhando de
frente para a igrejinha, a Pedra Menina estará cerca de 1,5km sentido NOROESTE.
Esta é uma informação importante caso você chegue anoite e não seja possível
ver a pedra.
A Orientação da pedra é Oeste. Fomos
em outubro, o sol batia no paredão a partir de meio dia aproximadamente.
Mapa da localização do maciço da Pedra Menina (muito útil para quem chegar a noite no local) |
Aproximação até a via
Partimos de BH às 20:40. Estacionamos o carro
para começar a trilha a meia-noite. A única demora foi porque paramos para
comer no posto entre o retorno e a entrada para Palmital dos Carvalhos. Era uma
sexta feira e não houve trânsito intenso.
Durante todo este tempo tínhamos sempre a
sensação que a pedra estava a nossa direita, pois, era onde o terreno se
elevava.
Acampamento 1: bem longe da pedra, neste momento da foto estávamos mais perdidos que azeitona em boca de banguelo |
No outro dia acordamos bem cedo, por volta das
5:30, tomamos um café, e, após uma breve reconhecida no terreno, percebemos que
não tínhamos sequer sinal da Pedra Menina. Começamos então a saga para achar o
tal maciço.
Foram cerca de 2 horas para visualizar a pedra,
isto mesmo, duas horas de muita subição de morro e caminhadas em vão, até nosso
companheiro Gustavo Vianna descer até o vilarejo e perguntar aonde se
encontrava a tal Pedra Menina. Está aí a importância de um bom beta e um bom
relato: evitar a vergonha de ir escalar e ter a sensação de que sequer a pedra
você conseguirá ver.
Se tivéssemos o mapa que desenhei no capítulo
acima, teríamos sido poupados dessa roubada que teve como consequência a nossa
sede mortal no meio da via num sol escaldante.
Ao visualizar o maciço, começou nossa saga para
encontrar a base da via. Isto também não foi nada fácil. Acabamos entrando numa
via errada, segunda mancada dos caipirões de primeira: Pastor, Gustavo e Eu.
Mas era pra isso que estávamos lá, quebrar a cara, consertar o erro, e entrar
em outra roubada logo em seguida. Permanecemos nesse loop infinito até domingo
a noite. Não faltou diversão hora nenhuma.
Pelos nossos cálculos, nós entramos por engano
na via choquito, uma via inacabada. Tínhamos a informação do croqui que havia
um totem na base da via e os primeiros lances eram numa canaleta. Aparentemente
este totem havia sido levado pela chuva. Como a via choquito começa numa fenda
bem grande em um “totem” enorme, decidimos acreditar que ela era a canaleta.
O guia logo percebeu o erro, desceu da via ,e,
enfim, lá pelas 10:00h aproximadamente conseguimos finalmente achar a base da
via, cerca de uns 15 metros a direita da choquito.
Ou seja, foram cerca de 4 horas de tropeços
para enfim começar a melhor curtição! E, enquanto isso, nosso estoque de água só
baixava.
Primeira enfiada da via No Último Minuto - Pedra Menina - Como deu trabalho simplesmente chegar até aí! |
A escalada:
A primeira enfiada da via é bem legal. Um 6sup
com uns 2 lances mais técnicos. Não utilizamos o móvel antes da parada como
dizia no croqui. O estilo da escalada é de muita aderência. Poucas agarras de
mão passam confiança. A rocha é aderente, mas os lances muitas vezes são
adrenantes.
Bernardo Pastorine (Pastor) chegando na parada P1 |
A segunda enfiada segue o ritmo da primeira:
agarras de pé e mão bem pequenas, muitos lances de aderência e equilíbrio além
da sensação constante de a qualquer momento escorregar via abaixo. Há um lance de
5sup esticado. O final é uma travessia horizontal delicada. Muito boa esta
enfiada.
A terceira enfiada pode gerar dúvida. Deve-se
continuar na travessia horizontal somente um grampo após a parada P2, e, a
partir daí seguir verticalmente. Nós seguimos os grampos horizontais na
travessia e acabamos entrando em outra via que não sabemos o nome (terceira
grande mancada, vou parar de contabilizar de agora pra frente). Esta terceira
enfiada termina numa outra travessia horizontal no sentido contrário. Bem mais
tranquila que a primeira. Tranquila em termos, pois, foi nela que nosso maior
incidente ocorreu.
Pastor e eu, errando a linha da via após a P2. Inocentemente felizes.. |
Nessa última travessia aconteceu um infortúnio
com nossa equipe. O segundo a subir levou uma enorme vaca próximo ao penúltimo
grampo da travessia, como era uma passagem horizontal, a queda foi em pêndulo,
daquelas ruins de tomar. A vaca foi longa com direito a duas quicadas na
parede. Passado o enorme susto inicial e conferida a situação de nosso
companheiro, juntamo-nos na parada P3 para avaliarmos nossa condição. A
situação era a seguinte: havia uma possibilidade pequena de chuva, estávamos
tomando muito sol e com muita sede. A água estava praticamente no fim. Faltavam
mais três enfiadas no total: uma com um final bastante exposto (4a enfiada),
uma enfiada fácil (5ª enfiada) e um trepa pedra até o cume (6ª enfiada). O psicológico
da equipe estava abalado devido a vaca e a sede. Mas decidimos terminar a via:
eram 3 rapéis e ficar sem cume, ou 3 enfiadas e sair com cume. Bora tocar pra
cima então!
A quarta enfiada é bem interessante e ótima para se guiar, até o penúltimo grampo. Para chegar na parada P4, há um diedro de cerca de 6 metros sem proteção. É muito exposto (E3) e não convém cair. Lembro-me de engolir seco ao ver a distância que a próxima proteção estava de mim, não queria ser o próximo a sair quicando pela parede, porém, a sede estava tanta, a vontade de voltar ao acampamento e beber água era tão grande que eu nem titubiei muito em começar logo a subir aquele diedro. Foi o lance mais exposto e adrenante que já guiei. Fiquei muito satisfeito com a superação do medo.
Eu guiando rumo a parada P4 (ou P3 não lembro) |
A quarta enfiada é bem interessante e ótima para se guiar, até o penúltimo grampo. Para chegar na parada P4, há um diedro de cerca de 6 metros sem proteção. É muito exposto (E3) e não convém cair. Lembro-me de engolir seco ao ver a distância que a próxima proteção estava de mim, não queria ser o próximo a sair quicando pela parede, porém, a sede estava tanta, a vontade de voltar ao acampamento e beber água era tão grande que eu nem titubiei muito em começar logo a subir aquele diedro. Foi o lance mais exposto e adrenante que já guiei. Fiquei muito satisfeito com a superação do medo.
A quinta enfiada é relativamente tranquila.
Mais positiva, porém, a pedra fica cada vez mais lisa e tem apenas 3 proteções
em 60 metros.
A sexta enfiada talvez nem mereça ser
considerada um enfiada. Subimos todos a pé, sem proteção.
Os três mortos de sede no famigerado CUME!!! |
Toda a escalada durou cerca de 4 horas. Ou um
pouco mais talvez. Para poder beber água, ainda tivemos que caminhar quase uma
hora até nosso acampamento, o qual confirmamos estar localizado no meio de lugar
nenhum bem distante da pedra.
Para terminar nosso dia light ainda tivemos que juntar forças para mudar nosso acampamento de lugar, fomos para perto da pedra. Quando enfim me encontrei deitado no colchonete da barraca não gastou nem 5 segundos pra eu apagar, mas, ainda deu tempo de dar umas risadas sozinho pelo dia incrível que havíamos tido.
O naipe de como andávamos mato a fora. Dica útil, nunca leve a porra duma caixa de papelão pra andar no mato. Dê um jeito de caber tudo nas mochilas. |
A investida como um todo foi muito exaustiva, a sede foi o perrengue mais marcante. O aprendizado com relação à logística e informações precisas foi enorme, além disto, o aprendizado técnico com relação aos procedimentos, monitorado pelo nosso companheiro Gustavo Vianna, foi muito bom.
A intenção a princípio (quando saímos de Belo Horizonte) era encarar outra
empreitada no dia seguinte, porém, concluímos que já havíamos tido emoções
suficientes, e, então, reservamos apenas uns treinamentos leves de escalada em móvel
para o domingo. Foi a melhor decisão que podíamos ter tido.
Autor do relato: Gilberto Martins Assunção Valadares da Silva
Autor do relato: Gilberto Martins Assunção Valadares da Silva
Croqui da via No Último Minuto
Croqui da Via No Último Minuto - Pedra Menina MG |
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